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Mostrando postagens com o rótulo Metmuseum

Salvos pelo tapa do pessimismo

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  Objeto: Auguste Barre, Medalist: Jules-Clément Chaplain. Met. Um pouco de realidade e pessimismo faz bem. Sempre faz. Muitos de nós, mesmo vivendo na ilusão de vídeos curtos das redes sociais, jamais teremos uma casa de luxo, nunca saberemos como é estar dentro de um carro de luxo e comer alimentos de alto padrão de qualidade.  Muitos de nós, invejando e desejando a arquitetura da casa de um famoso, o carro confortabilíssimo de um "influencer" e a rotina de um multimilionário, passaremos a vida comendo ultraprocessados feitos de químicos com sabor de tal alimento, com a textura de tal produto - sem jamais chegar a degustar o alimento verdadeiro.  Fingimos falar outro idioma quando na verdade sabemos uma ou duas palavras - o suficiente para fingir que compreendemos o que os personagens de séries e filmes medíocres estão falando. No máximo, viajaremos alguns quilômetros e não tocaremos a realidade do nosso próprio país porque a parca educação que recebemos é suf...

Numerografados

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  Arte: "Trotting Cracks" at the Forge, Currier & Ives. Met. Somos números. Documentos pessoas nos tornam frios algarismos. O sistema de educação e de saúde nos torna índices - meros números que são passíveis de interpretação. O mercado financeiro nos transforma em cifrões que devem ser empilhados para demonstrar o quão rico e importante é um certo indivíduo ou organização. No fim, nada mais que números.  Entre um sistema de classificação e interpretação e outro, comemos, sorrimos, choramos, enterramos outros números, parimos outros tantos e fazemos a máquina movimentar as telas concretas de um mundo apenas abstrato. Sendo números, embora com sangue esquentado pelo calor dos trópicos, é dito inadmissível que queiramos mais, nem é muito, apenas um pouco mais.  A recusa em ser apenas máquinas que sangram nos faz cair no desprezo dos donos do capital. E é somente essa recusa que nos mantém vivos, apesar de toda a estrutura de escravização moderna que nos mantém...

Breves linhas periféricas

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Arte: View of the Brenta, near Dolo, Giambattista Cimaroli. Met.  Na periferia, na praça esquecida pelo poder público, dois times concorrentes formados por moradores locais distraem transeuntes e os próprios jogadores dos acontecimentos tediosos que estão prestes a serem reiniciados pela rotina do trabalhador brasileiro . Os pontos comerciais começam a abrir e empregados do varejo, sentados à porta dos estabelecimentos esperam o tempo de humilhação regimentar que caracteriza a diferença entre patrões e empregados.  Nas ruas, sacolas de lixo esperam ser recolhidas e animais abandonados aguardam a cota de ração doada pelo pet shop local. A vida periférica parece ser a mesma, sempre: trabalhadores indo ao trabalho bem cedo, comerciantes humilhando os trabalhadores, velhos se preparando para o culto e ruas sujas. Observando de longe, é um local vulgar, sujo e que serve de depósito para pobres.  Nas regiões "nobres", as padarias são delicatéssen , os empregados não s...

Declaração vivificante

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 Foto Foto: Osiride statue of Senwosret I.Middle Kingdom. Met   Maria Bethânia canta  "Com todas as palavras Feitas pra humilhar Nos afagamos" E a madrugada, por mim, através de mim, sobre mim, escreveu uma petição digna de doutores advogados do tipo que não se formam mais em universidades, por obra e graça de redes sociais abstratas.  A cerveja segue gelada. O condicionador de ar segue tentando resistir ao ar quente da boca do inferno aberta no centro do Brasil. E eu sigo sendo o príncipe negro fruto de relações divinas de deuses negros, protegido por guardiões velhos e sábios. Caminhando no precipício de viver na borda de um mundo insone.  Eu sigo sendo um em uma multidão de iguais, tentando não ser igual, sobrevivendo ao absurdo de ser só mais um.  O futuro é a morte. E eu sou o incesto entre a morte e a vida. Eu sou a base, a coroa, o pó, o cume, o bandido, o herói, o Cão, o Deus.  E ninguém entende isso.  Elas passam, se benzem e se...

Os boçais transformadores do outro

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Arte: New York Daily News, William Michael Harnett, 1888. Met.    É engraçado. As pessoas entram na sua vida - e, às vezes, você só que instrumentalizar antigos dramas para revivê-los ou superá-los - com a arrogância de serem as únicas. A transformação que pretendem operar em você ou no seu estilo de vida é o objetivo da relação e serve apenas para mostrar que podem fazer - não que, necessariamente, seja o melhor.  Então, um dia qualquer, tudo degringola e você acaba sendo o que sempre foi, limpando não os cacos de si, mas a sujeira de ter se misturado com os porcos para saber como estes vivem. E segue a vida como se a estrada fosse um detalhe e o importante é não ter ou ver importância nas pequenezas dos relacionamentos e do pós-venda desses relacionamentos.  O tempo vai fluindo, você vai se limpando e os resíduos sólidos e líquidos são recolhidos pela limpeza pública. O tempo, sempre o tempo, julgando a todos e sendo impiedoso, para o bem e para o mal.  De rep...

Condomínios sempre são favelas

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Obra: 1886. Perkins Harnly. Metmuseum.  Prédios, por mais sofisticados que possam parecer, é apenas uma releitura dos barracos de papelão e sucata que outrora fizeram os morros ocupados indevidamente serem chamados de favela. Se nos barracos de tijolos, papelão e sucata que vemos nas periferias de grandes metrópoles não há privacidade, dignidade e vida digna não é em sofisticados barracos que esses critérios de sobrevivência são encontrados.  É bem verdade que quanto mais você gastar em um barraco sofisticado, comumente chamado de apartamento, mais terá um distanciamento do seu vizinho da frente, de cima e de baixo e poderá viver em um submundo psicodélico em que quanto mais alto for o seu barraco mais "rico" será entre os seus pares. Doces ilusões criadas pelas imobiliárias e incorporadoras para justificar o empilhamento de seres humanos a preços altíssimos e com pouquíssima liquidez do dito imóvel. Nas favelas os vizinhos se conhecem, sabem o que acontece nas imediações...

O ódio da mulher ressentida

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  Fonte:  Portrait of a Woman. Netherlandish Painter (ca. 1540–50). Metmuseum Há um ódio cultivado nos espaços físicos e virtuais que é sentido e muito pouco comentado. Trata-se do ódio feminino contra outras mulheres e contra toda a comunidade LGBTQIAPN+. Um ódio tão escancarado que deixa o observador menos atento horrorizado com tamanha ousadia odienta.  Protegidas por discursos construídos para protegê-las mesmo diante das mais absurdas barbaridades que cometam, as mulheres começam a se tornar opressoras, à semelhança do seu opressor do passado. Não aceitam as escolhas dos homens em assumir sua identidade de gênero e as suas preferências sexuais; não aceitam a independência de outras mulheres, a despeito da idade, da aparência e/ou da profissão; não aceitam não serem mais as escolhidas para a convivência por conveniência social. Os homens, mais livres do machismo perpetuado pela mulher no processo de construção da identidade social, aceitam, falam e agem como...

Anestésico musical

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Warrior and Attendants. Séc. 16-17. Metmuseum.   O plano de destruir a cultura popular, não exclusiva apenas dos governos de centro e extrema direita, parece estar seguindo o caminho do sucesso. Entre músicas fáceis de decorar e reproduzir e subcelebridades instrumentalizadas no desmonte institucionalizado, nos diversos níveis de governança, não há mais letristas que retratem a vida do pobre e a hipocrisia de uma sociedade doentemente religiosa, como se sabe em Construção e Geni e o Zepelim de Chico Buarque ou Faraó, eternizada na voz potente de Margareth Menezes.  Não querem que o pobre pense e reflita sobre si e suas condições de vida. Não é interessante para os políticos que se mantém no poder no planalto central ou nas casas de poder "popular" dos governos subnacionais. Não se ouve mais nada semelhante a 2 de junho, de Adriana Calcanhotto, Bichos Escrotos, dos Titãs, ou O tempo não para, do Cazuza, nos meios de comunicação e na boca do povo. Em meio a tragédias ambientais...

Entre camadas

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Foto: Queen Mother Pendant Mask: Iyoba. Met Museum Sob as várias camadas de padrões comportamentais exigidos no trabalho, na organização religiosa, nos círculos sociais físico e nos virtuais, quem é você? Quantas enfermidades, físicas e mentais, você desenvolve apenas por fingir, continuamente, ser quem não é? Seus preconceitos, suas vaidades, seus defeitos, suas idiossincrasias negativas, seu lado negativo, seus arremedos intelectuais, seu fascismo interior, seu nazismo cultural, sua cruzada pessoal em direção ao lugar seguro em que os horrores pensados podem ser verbalizados, sua projeção real distorcida e deformada é o que você é. Tudo isso é o que você é. Empurrar uma criança na rua que se joga ao chão fazendo birra, odiar os parentes velhos por toda uma vida de injúrias e opressões, orfanar-se de pais cruéis, detestar filho, desprezar animais, consumir como se não houvesse amanhã todos os bens úteis e inúteis possíveis, deixar-se viciar e ser viciado nos sexos, aduzir-se em pr...

Como o primeiro domingo

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Arte: The Israelites in Egypt–Water Carriers, from "Dalziels' Bible Gallery". MET. São os primeiros dias do mês e o burburinho sobre os depósitos nas contas bancárias está em alta. Afinal, o dinheiro precisa estar presente para atestar o fato de que nós nos vendemos barato demais para sustentar a vida de luxo de alguns poucos. Mas é domingo - pé de cachimbo, cachimbo é de ouro...- e o calor pede uma praia ou uma sombra na calçada para ver os cristãos neopentecostais desfilarem rumo a igrejas. Por falar nisso, melhor calar sobre a responsabilidade de certos cristãos nas mortes de brasileiros por covid-19, violência periférica, homofobia e racismo - não quero estragar a pretensa idolatria a cada esquina. Ainda não vi meu vizinho neopentecostal - pássaros presos e gemidos à noite é o melhor que ele pode oferecer em termos de fofoca, uma decepção. Talvez, somente talvez, mandem executar as folhas de pagamento amanhã e os assalariados tenham dois minutos de paz - um dia eles a...

Case de sucesso

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  Obra: Couple Entering Building, with Attendant (from Cropsey Album).  Carl Friedrich Heinrich Werner MET. Não é o que temos que define a alegria que sentimos e o percurso para conseguir alcançar as metas e objetivos. Também não vão existir regras que definam os sentimentos antes, durante e depois. É a amplitude de tudo o que pode acontecer e, positivamente, nos surpreender que torna, no fim, a história em uma case de sucesso.  Aliás, sucesso não são as comparações, por vezes inevitáveis, que possamos inadvertidamente fazer. Sucesso é tudo aquilo que você deseja que ele seja e que, independemente do que for, só cause bem-estar.  Estamos aí em automóveis, em trânsito congestionado, sobrevivendo à seca ou às enchentes, revoltosos ou não com a subordinação do trabalho provocado pelo modelo tóxico do capitalismo desenfreado, esperando mais um feriado? O carnaval passou, depois de uma pandemia, como uma pausa necessária e breve no cotidiano de todos os brasileiros....

Uma heresia de segunda

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Escultura:Couple. Povos Sakalava. MET Os muito medíocres criaram, em seu deturpado imaginário, que devemos nos arrepender de alguma ação pretérita que, pela força do querer ou não, tenhamos cometido. Nesse mesmo imaginário estamos todos sujeitos ao erro e, por esse  erro cometido, mais dia ou menos dia, devemos ser e permanecer contritamente arrependidos. Esquecem, muito fácil, das delícias de certos erros e da necessidade de outros. Dependendo do ponto de vista e da elucidação correta de todos os fatos, não há erro. Apenas meras escolhas a serem tomadas em um mar de caos de um dado momento.  Expressar tamanha heresia só tem um sentido: o da luz. Em uma sociedade que escolhe a religião como arma e refúgio e que, sob esses mesmos aspectos, adoece paulatinamente sem que nenhum Deus a socorra, é impressionante como Marias Madalenas modernas revisitem o conceito de arrependimento quando as convém; como homens escolham um modelo que não abale sua ardente ignorância e como, desde ce...

Os doentes

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  Davida Johnson Clark, Augustus Saint-Gaudens. MET Pessoas doentes adoecem outras pessoas. Isso é real e vejo todos os dias, sem nenhuma exceção. Na fila do pão, os carentes demoram a escolher o produto, conversam com a atarefada atendente, demoram em fazer o básico. No trânsito, sem meias palavras, os palavrões tomam conta do ar empesteando mais que os gases dos escapamentos.  Os ressentidos tomaram as ruas, as salas de aula, as cozinhas, as pequenas e médias empresas, as calçadas, as casas.  Os ressentidos tomaram conta de tudo. Os outros doentes, nem sempre sob medicação, preferem brincar consigo, adoecendo os outros com falsas perspectivas e palavras vãs. Clonazepam, benzodiazepínicos, anti-depressivos, anti-vida, refúgios em comprimido - tudo é usado como desculpa e arma. E a sociedade, geração após geração, sob siglas, se autodestroi impunimente. 

De verdade, muito se quer

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  Alison Saar,  High Cotton II , 2018. É fácil saber o que não precisamos - o corpo, as pedras da rua, a poeira sobre a lataria dos automóveis, os cabelos coloridos e crespos das pessoas berram a cada instante mostrando não apenas desagrado como também franco desarranjo da natureza do querer real que se refugia no íntimo. Não demora e o cansaço se faz presente, o malquerer dita as palavras e nenhuma boa vontade surge no horizonte das coisas que se deseja.  Agora estamos nós, lutando contra os poderes instituídos, esperando milagres intempestivos, como se não detivéssemos poder para sermos melhores ou ditarmos o fluxo dos acontecimentos que nos pilham a vida, o humor, o estado atual.  Nada mais nos importa. E, de novo, é hora de ir.  A lagoa secou. A vaca dá leite amargo. O milho não cresce. Nós definhamos aos poucos.  O pouco não nos encanta, assim.

A queda dos monogâmicos

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The personification of peace. MET. Meia palavra basta. Uma escolha por ser ausente basta. A publicação das escolhas basta. Entende quem quer e quem pode. É por isso que agora eu observo, na claridade da luz do dia de verão mais quente e calorificamente intenso, a queda de certas relações monogâmicas com a mesma certeza que temos, hoje, da queda de impérios, regimes, governos, populares figuras. Porém, não se engane, não é a espera pela queda de certas monogamias de periferias que importa por inveja, ressentimento ou ciúme; não é. É apenas a confirmação, cedo ou tarde, das consequências das escolhas, dos silêncios, da corrosão de relacionamento que precisam de muito esforço para sobreviver. Relacionamentos amorosos, amigáveis, paixões contidas em máscaras diversas. Não precisa justificar.  Não precisa fugir. Não precisa dizer-se feliz em uma redoma social. O tempo está aí, correndo em seu fluxo imparável, rumando para as quedas - de cabelo, de dentes, dos seios, das nádegas, dos rel...

Percorrendo a linha de mim

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  Bust of an Old Man Wearing a Fur Cap, Jan Lievens. MET. No passado corri léguas sob o sol por quem me jogava migalhas e feliz me encontrava - tantos traumas me açularam ao erro, à discordia, ao caminho longe de mim que hoje não mais percorro um metro por ninguém, às vezes nem por mim.  Agora sou esse - solitário perdido em meio a meus pensamentos mais banais, perdido na estrada da vida e sem saber para onde ir, apesar de saber com a máxima certeza que não vou seguindo ninguém, para nenhum lugar. Amanhã, quando eu acordar, vou saber que de todas as humilhações por que posso ter passado  nenhum remete-me à mendicância de afeto, de atenção, de carinho. Sim, pode faltar-me o alimento, o exercício físico, o teto, a cama, a cadeira, a fé; só não me falterei a mim.  Assim começa uma madrugada, aninhando um dia.  Assim prossegue minha vida. Assim eu sigo.

Ultimátum

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View of South Street, from Maiden Lane, New York City. MET.   Aos poucos, sem alarde, sem mensagens dramáticas, sem olhos chorosos, em um estado de vívida depressão, vou me envenenando aos poucos, sendo imprudente aos poucos, sendo autodegradante ao extremo.  Morro aos poucos, de faltas imensas que foram transferidas, geração após geração, até chegar a mim, sempre com um requinte a mais. Falta o teto, o alimento, o lugar para a memória feliz e para a fotografia, faltam os sentimentos, falta a dignidade.  Morro aos poucos pelos excessos que a falta faz.  E, sendo um moribundo à beira da estrada da vida, marginal das próprias construções sociais, não é estranho querer deixar essa vida de serventia ao alheio. Não é.  Loucura indescritível é fazer diariamente o que outrem deseja e esperar conquistar-lhe sorrisos e palavras cálidas. De mim só quer a minha força para construir seus castelos e manter o cheiro de mofo das edificações erigidas em um passado sangrento. Po...

Palavras em riste!

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Hiawatha ,  Augustus Saint-Gaudens. MET.   Ali na esquina da praça Horácio Souza Lima, onde tantas expressões são manifestadas diariamente e por tantos indivíduos particulares, ouvi, em alto e em bom som, que  "quem sai com viado é viado também!". Atirada à queima roupa em um meio-dia parece mais um assassinato à liberdade de expressão do próprio querer de sair com quem desejar para não parecer viado . Ora, passou o tempo e a geração de quem se escondia entre becos e palavras codificadas para marcar encontros e expressar afeto pelo mesmo gênero. Os lugares escuros, fétidos, sigilosos ficaram para aqueles que andam armados com problemas sociais de autoaceitação e extremo julgamento da vida alheia.  Ao meio-dia, de qualquer dia, a fome bate à porta de homens e mulheres e ignora completamente os frequentadores das camas; a violência, por outro lado, assim como as criaturas armadas de palavras, escolhe lugar, cor, gênero e classe social, vitimando gays, pretos, periféric...

Comida de monstros

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Foto: Funerary relief. ca. 200–273. MET. "O infortúnio é múltiplo. A infelicidade, sobre a terra, multiforme."  Berenice Edgar Allan Poe  Procuramos infelicidade em tudo o que nos cerca, até mesmo nos momentos de felicidade e tranquilidade, porque não sabemos lidar com estas duas facetas da vida. Fomos talhados para a agonia, para o trágico, o drama, as ruindades do cotidiano. Se algo nos vai bem logo procuramos  um ponto sensível para sermos molestados por nosso próprio modus operandi de viver em estado de lágrimas.  Traições, palavras falsas e cruéis, pessoas a oprimir e sermos, por elas, oprimidos, escassez transformada em excesso - elementos de uma vida viciosa que nos espera a cada noite.  Somos seres mesquinhos com nossa própria alegria de bem estar e isso nos mata aos poucos, cada dia uma dose maior, cada hora um momento morto por nossas mãos assassinas de bons momentos. De repente isso é reflexo da doutrinação cristã que nos imprime à mente a ideia de qu...

O dia de depois

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Quadro: Jovem Esposa: Primeiro Cozido. Lilly Martin Spencer. Metmuseum.         É o segundo dia do ano e o calor lanha minha pele com seu chicote implacável. Na lembrança, a última boca que beijei em 2021, macia, grande, falsamente temerosa e quase inalcançável no alto do seus 190 centímetros. E se a ordenha não saiu na virada, pode ser que saia repentinamente por uma mão macia ou uma boca sedenta, sempre da etnia negra.  Na padaria, a inflação açoita a mim, a mulher que estava no caixa, no fim de uma interminável compra, e que também trabalha lá durante a semana. Para o Alan, a inflação parece que só faz bem.  A Coca-cola parece aguada e a caixa de bombom Garoto não é tão apetitosa como parecia na hora que escolhi comprar. Será efeito do resfriado que peguei na madrugada do dia 31? Ou é porque a produção desses itens está com a qualidade duvidosa? De qualquer forma, é o que acontece hoje. Hoje, engraçado que o hoje, o presente, precisa de um pouco mais de ...