Entrevista com Ivan de Almeida

Ivan de Almeida
A conversa de hoje é com o jornalista, editor e escritor Ivan de Almeida. Em 2009 Almeida fundou a Cogito Editora e desde então tem publicado coletâneas de autores locais e internacionais, como é o caso da Antologia Poética- Cogito que surge a partir do Concurso Internacional promovido pela Editora. É autor dos livros Ciclo do Pareta e outros Poemas e Mídia e Carnaval. Está para lançar a biografia Argeu - Uma vida de trabalho, coragem e ternura. E conversamos sobre a arte de escrever, as novidades editoriais de sua editora e autores/livros.



Rafael Rodrigo Marajá: Por que escrever?

Ivan de Almeida: É uma forma de deixar algo para as futuras gerações. Descobri minha inclinação para a poesia em 1996 e hoje como jornalista e pesquisador tenho a escrita não somente como arte mas também como instrumento para o relato histórico de coisas, lugares e pessoas.


R.R.M.: O jornalismo abre muitas portas para o profissional. Alguns acabam reunindo uma vida inteira e escrevem um livro. Qual sua motivação para escrever e organizar várias obras?
                                                                                                                       
Almeida: Do ponto de vista intelectual o jornalismo pode abrir novas possibilidades, mas para quem busca além do trivial e está disposto a “nadar contra a maré” nessa sociedade pragmática. O que vemos atualmente são muitos profissionais medíocres, se vendendo ao sensacionalismo dos jornais e emissoras de Tv. Existem muitos jornalistas sem muita capacidade de reflexão, sem hábito de leitura, sem participação social, sem ideologia, mas também tem aqueles que são verdadeiros exemplos de profissionais, cito dois dos quais tive a satisfação em conhecer: Fernando Coelho e Sérgio Mattos, escritores, pesquisadores, poetas, intelectuais de valor. Para mim o jornalismo me ajudou a ser um editor de livros mais capacitado, também não me limitei a graduação, busquei me aperfeiçoar com cursos técnicos de editoração, design, fotografia e uma pós-graduação em marketing digital com a intenção  de agregar valor a minha atividade. Além da poesia, hoje busco também focar em trabalhos de pesquisa e o mestrado será um caminho natural. Também começo a escrever biografias.      

R.R.M.: Em 2009, fundou a Cogito Editora, onde, entre outros cargos, é Editor. Como analisa os escritores da “era facebook”?

Almeida: A internet surgiu como importante ferramenta para divulgação dos novos autores, mas hoje a superficialidade em geral, inclusive na literatura preocupa. Vejo autores publicando textos de má qualidade em sites, blogs e nas redes sociais.  É visível a falta de cuidado para com seu trabalho, talvez seja fruto de uma época em que o instantâneo tem lugar de destaque. Já publiquei dois poemas no Facebook e penso que quando isso é feito com bom senso, respeitando sobretudo seus escritos, sua arte, bem revisado e trabalhado, não vejo problema. O complicado em minha opinião é a perda do ineditismo do texto, sobretudo no que se refere a poesia, sem contar que muitos tem o hábito de “curtir” mas são poucos os que leem, sentem e entendem o poema, não que não tenham capacidade para isso mas  é do tempo da própria internet fazer com que coisas perenes percam o valor. Eu não abro mão de publicar meus poemas inéditos em livro, depois podem vir as outras formas de divulgação do trabalho por meio da internet.


R.R.M.: Do ponto de vista da Editora, como vê a produção literária do nordeste? Continua criativa ou caiu no esmaecimento de copiar grandes obras?

Almeida: O nordeste tem a tradição de apresentar grandes escritores e poetas, haja vista Castro Alves, Gregório de Matos na poesia como maiores representantes da poesia baiana, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto em Pernambuco, Jorge de Lima em Alagoas, Lima Barreto em Sergipe, Aluísio de Azevedo, Gonçalves Dias e Ferreira Gular do Maranhão, Rachel de Queiroz e Patativa do Assaré do Ceará  e tantos outros grandes nomes a perder de vista. Na prosa temos figuras de imenso destaque como Graciliano Ramos, Jorge Amado,  José  Lins do Rêgo, Ariano Suassuna, José de Alencar, João Ubaldo Ribeiro e Antonio Torres. Uma literatura que já produziu autores de valor como a nordestina jamais vai se esmaecer até porque os autores do nordeste sempre tiveram que ser criativo para sobressair e obter valorização.

R.R.M.: Como Editor, acredita que a Poesia assume o lugar da Prosa (Crônica e Conto) por falta de incentivo à produção de livros densos?

Almeida: Cada linguagem tem sua importância e nenhum desses gênero pode ter a pretensão de assumir o papel de protagonista.  Eu particularmente vejo que a poesia tem mais capacidade para explicar o mundo e esse pensamento eu compartilho com grandes pensadores a exemplo de Heidegger, Schopenhauer, Nietzsche, Pound, só para citar alguns. A falta de prosas mais densas como já foram escritas em outras épocas a exemplo dos obras marcantes como Crime e Castigo de Fiódor Dostoiévski, O Retrato de Dorian Gray de Oscar Wilde, Em busca do Tempo Perdido e Marcel Proust, A Montanha Mágica de Thomas Mann, talvez seja porque vivemos em uma época superficial. O pior é que quando se trata de Brasil essa situação é mais grave. Vivemos em um pais de não leitores e isso é angustiante.


R.R.M.: É de sua autoria o recente Mídia e Carnaval: Uma representação midiática do Bloco Mudança do Garcia em 1930. Qual sua intenção ao escrevê-lo: torna-lo crítico ou histórico?

Almeida: Considero este livro uma nova vertente dos meus escritos. Pretendo trabalhar com pesquisa, sobretudo histórica pois sempre tive essa inclinação para relatar fatos, talvez se não fizesse comunicação social, certamente faria história. O conhecimento que obtive com a minha formação em jornalismo de certa forma me proporcionou a oportunidade de ser um historiador e biografo com um olhar maios objetivo e coeso.


R.R.M.: Tem alguma aproximação com o Bairro Garcia?

Almeida: Nasci e fui criado no local, portanto, o meu relato também tem algo de pessoal. Independente disso, o tradicional bairro do Garcia tem papel importante na história de Salvador devido às suas marcantes manifestações culturais, sobretudo as carnavalescas como  o bloco  sem cordas “Mudança do Garcia”.

R.R.M.: Como definiria o carnaval e a relação deste com a mídia?

Almeida: Em minha pesquisa fiz questão de mostrar que em 1930 a relação da mídia com o carnaval era infinitamente menor, hoje é completamente diferente. Temos uma festa pautada no lucro, uma grande indústria. O que não mudou foram os padrões socioeconômicos, os negros e pobres continuam marginalizados enquanto os brancos que antes estavam nos clubes carnavalescos e carros alegóricos hoje estão nos luxuosos camarotes e nos caríssimos blocos. Assim como no Rio, em Salvador o carnaval é uma festa para o estrangeiro ver e curtir, enquanto isso continuamos tendo  a manifestação momesca como vitrine da desigualdade social que existe no dia-a-dia do nosso país seja nas capitais ou no interior do Brasil.    


R.R.M.: Quais as novidades deste ano da Cogito Editora?


Almeida: Lançaremos em Salvador a nossa antologia resultante do Concurso Internacional de Poesia organizado pela Cogito. Já lançamos no Rio de Janeiro e agora em maio será a vez de Salvador, na ocasião divulgaremos o edital do segundo concurso. Também já está em curso os projetos editoriais: a Solilóquio, em parceria com Blog da Gaivota e o segundo volume da Mundo – Antologia poética Também estamos nos preparando para lançar a biografia de nossa autoria Argeu – Uma vida de Trabalho, Coragem e Ternura. Além destes temos muitos outros lançamentos no segundo semestre e no final do ano a nossa mais tradicional antologia Focus.


Obrigado pela entrevista, Ivan!
Essa entrevista foi concedida por e-mail.

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