Um ex-amor, uma madrugada




Outra madrugada, caminhando sob o olhar nu de uma índia, entre um açude e um labirinto de casas, fui colocado no desenlace entre um arlequim e uma colombina. Tão feia foi a cena que era preferível que não tivesse visto. Aliás, coisa natural da cidade do amor, é encontrar, sempre após uma festa pública, namorados públicos que se desentendem e vão, senão aos fins de fato, pelo menos à beira de um afogamento no açude municipal, que depois fica estigmatizado como um lugar só de suicídios – pobre açude!
A colombina, em posse do discurso decorado e repassado milhares de vezes, quem sabe naquela noite mesmo, tentava colocar sob uma ótica simples e banal o fim de um relacionamento que “já não dava mais certo”, sem razões aparentes ou justificáveis para o arlequim, que não se desprendia do hábito de um relacionamento estagnado na monotonia de um amor à Palmeira.
E lá, nos breves momentos que antecedem aquele crucial momento em que um vai embora e o outro fica para trás, em revolta de amor e ódio, que fui passando por mais um problemático ex-casal, que se tornou um problemático dois eus, na cidade que dizem que é do amor. Se é de um amor até épico, deve existir um forte motivo para que nada dê certo nessa cidade tão amorosa.
Então, com a esbelta índia a me olhar voluptuosamente de seu pedestal, sempre nua e jovem, fui caminhando para a esquina, de onde, poderia supor, teria que voltar ao ouvir um corpo caindo nas águas municipais. 

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