Sem avisos
Um dia eu vou sumir, não aos poucos como uma fruta que se parte em pedaços e é engolida sem pretensão. Será de uma vez. Súbito. Não, não é estado de tristeza ou depressão que inflama essa afirmação. É um doce sabor de quem há de experimentar um arrebatamento cataclismico. De repente, não mais que de repente (como uma vez escreveu o poeta) eu sumirei em meio à multidão, sem ser notado, sem ser perturbado, sem alarde. E ficará, se alguém algum dia lembrar, como escreveu outro poeta, versos A um ausente. É só o que restará de mim pelas mãos de outro que me antecedeu. Um dia, eu sei, eu vou sumir. E como não se destroi um império em um único dia, assim eu vou me fragmentando, acostumando os outros com pequenas ausências, silêncios enormes. E onde eu vou parar ninguém sabe, nem eu, nem você, Olorum, de certeza, mas ele não vai contar. E vou viajar, como o Belchior fez duas vezes.