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Vizinha(s)

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Cond. Eucaliptus Do outro lado do quarto, no quarto do prédio vizinho, a vizinha troca de roupa. Tira calça e blusa. Refresca-se do calor. Faxina o quarto. Excita os homens do último andar do prédio de frente e irrita as mulheres do andar de baixo. Mistura a vida íntima à publicidade de celulares, fotos, sonhos e hormônios. A vizinha olha pela janela, abana-se com a mão, tenta decidir se veste a blusa branca ou a jeans. Decide tirar o sutiã. Vira-se. Revira-se. Veste-se e despe-se de novo. A vizinha é promiscua sendo natural. É gordinha com o vidro da janela, dela, fechado, e engraçada com ele aberto. Todos os dias a vizinha chega, tira a roupa e anda nua pela casa. Ela oferece água, lanche. Convida para uma tarde tórrida, com entrada pela janela do terceiro andar. A TV sempre ligada para abafar os ruídos da avenida, não os de dentro do apartamento. Sempre os de fora. A vizinha, de baixo, é sempre muito simpática, muito bonita, mas ela não anda nua. Ela não tem chance. A viz...

Metades

Vivemos em meio a esses amores tantos, diferentes, estranhos, problemáticos. Em meio à falta de amores. Enlameados na mais diversa maneira de estar. E estamos separados, com a vida insistindo em dar-nos milhares de motivos para sermos igualmente disputados nos meios em que adentramos. Isso é o que todo mundo sabe. O que ninguém sabe é essa mania nossa de falar com naturalidade das nossas coisas - que existem separadas uma da outra -, de pessoas - de nossas vidas separadas -, de flores, comida, pretérito, presente, sofrimento e vida. Nesse meio, um vendaval de dias, meses, talvez anos, encaminha um para o outro com a certeza de que não há data marcada, nem nuvens que separem-nos – exceto apenas aquela que interrompa o sinal da operadora de telefone. É o ... não. Não é o amor que nos une sob os laços que a distância impõe. Amor atrapalha, atrasa o tempo das coisas que são importantes, ilude o raciocínio e o pior: perverte as verdades que podem ser ditas. Pois também não é o d...

Os tênis do caminho

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Cena do filme Os 3 Os tropeços da caminhada, nas ruas e avenidas sempre tão iguais e poeirentas, são os obstáculos que precisam ser enfrentados para compor, aos poucos se sempre devagar, uma história, uma lembrança, amores, despedidas, encontros, recomeços. Às vezes são tantos tropeços que não tem calçado que resista, olho que não chore diante daquele amor que vai embora após tantas juras e promessas, corpo que chegue limpo ao final de um dia tropeçante. Um lance de escadas Em uma sacada Vários pares de pés Muitas propagandas é o que és! Muitos adidas todos iguais Reles e fúteis, no mais Não passam de meras propagandas Mas a mim não enganam Essas aparências sacanas... De um lado estão marcas, roupas, joias, fotografias. Do outro, estão os sentimentos – feras mutantes que não se aquietam em uma única maneira de ser. No meio, não do caminho, apenas no começo dele, está quem enxerga o chão e o céu, no mais alto grau de incompreensão, saudade, lástima ...

Entrevista com Cássio Cavalcante

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Hoje inicio uma rodada de entrevistas, ao ar sempre às segundas-feiras, em que entrevistarei escritores, políticos e pessoas que desenvolvem trabalhos ligados à ciência e tecnologia ou trabalhos que incentivam a cultura.  Cássio Cavalcante Para inaugurar essa rodada o entrevistado é o jornalista e escritor Cássio Cavalcante, autor de Nara Leão: A Musa dos Trópicos e Sob o Céu de uma Cidade, a ser lançado no próximo 31 de outubro. Cássio Murilo Coelho Cavalcante é jornalista, escritor membro da Academia Recifense de Letras e da União Brasileira dos Escritores, secção pernambucana. Escreveu diversos contos entre 2004 e 2008, todos publicados,  a biografia da Musa da Bossa Nova, Nara Leão: A Musa dos Trópicos (2009), Os Mistérios de cada Um (2007) e, a ser lançado, Sob o Céu de uma Cidade. Além disso, Cavalcante pertence a Academia de Artes, Letras e Ciências de Olinda e é Colaborador do jornal Folha do Estado do Espírito Santo, assina as colunas Bate papo Literal, do Jor...

O amor na madrugada

Todas as noites são existências de um sofrimento inominável que sai de você para mim sempre que seu sorriso quebra a geleira da minha alma. Assim como o calor derrete o gelo da garrafa ao lado do nosso sofá, displicentemente esquecido no começo de nossos devaneios de uma noite quente, o seu sofrimento de uma entrega intensa, duvidosa, é a prova de um grande amor conservado a temperaturas oscilantemente trabalhadas em nossos corpos. Meu grande amor cabe em uma minúscula artéria que imiscui-se a tecidos e vasos e quase se rompe sempre que o seu cheiro faz-se presente ao meu alcance limitado. Meu grande amor pode ser visto em poesias mal feitas escritas em guardanapos roubados das mesas vizinhas, em bares, restaurantes, lanchonetes, lugares comuns. Meu grande amor é triste pelo fim que imagina para si, entre soluços e lágrimas que não se contém no sofrimento mudo de palavras não ditas. É triste pela vida que acontece e que pode, repentinamente, acabar com uma pequena palavra dita. D...

SNCT - CIENART

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A Semana Nacional de Ciência e Tecnologia – SNCT – começou em todo o país. Em Sergipe, um dos principais eventos dessa Semana é a Feira Estadual de Ciência, Tecnologia e Arte de Sergipe – CIENART – que ocorrerá no Iate Clube de Aracaju no próximo dia 25 de outubro. Logo da CIENART A CIENART contará com a participação de professores e alunos de escolas públicas (municipal, estadual e federal) e privadas nas modalidades Trabalho Escolar, Iniciação Científica (PIBIC Jr) e Artística. Durante a Feira os discentes e docentes têm seus trabalhos reconhecidos e premiados, por categoria e modalidade. Desse modo, incentivam-se os professores a inovar em suas respectivas escolas, procurando melhorar o processo ensino-aprendizagem e aperfeiçoando técnicas já implantadas em salas de aula. Juntando ciência, arte e tecnologia é possível obter resultados surpreendentes e inovadores, que podem ser aplicados na própria escola e na comunidade próxima. Assim, após ter uma semana inteira ...

Um quase estado

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Fim de tarde em Palmeira dos Índios - AL Perdem o dia com o trabalho que paga a conta de água, energia, telefone. Perdem a noite pensando nos problemas que geram o dinheiro que garante a iluminação pública, a novela, a cama nem sempre tão confortável. Entre perdas diárias e perdas noturnas o entardecer vai se achegando à noite, misturando o azul do céu profundo com o escuro que torna brilhante as estrelas do céu, energia muitas vezes dissipada milhões de anos atrás e que só agora chega à visibilidade terrena. Nesses momentos de tênue estar, é fácil perceber que a tristeza do Pequeno Príncipe é tão cortante, tão íntima de quem lê as grandiosas páginas como a roupa que cobre o corpo cansado dessa corrida por dinheiro. Em muitos lugares, enquanto tantos perdem, principalmente o tempo, outros poucos presenciam o exato momento descrito pelo Pequeno Príncipe. E nem percebem. Também se percebe poucas coisas, fazem o que realmente querem e são pouco felizes. É fácil ser triste e infe...