Manhã alegremente cadavérica
Já era o meio da manhã, aquele ventinho frio entrando pela recepção e indo até nós lá dentro, onde outrora foi o quarto de um alguém vaidoso, quando a ambulância estacionou perto do letreiro luminoso, apagado porque era dia. Um alvoroço tomou conta dos ambientes em um quê de insana curiosidade por uma pessoa mal-nascida e impregnada com as malezas da carne. Olhando de longe os transeuntes poderiam pensar que o instinto maternal atacou-lhes as entranhas e o amor, psicodélico e quimérico, emanava pelo ar e através de mãos contaminadas pela ganância. Sim, pensariam todos os caminhantes que cruzasse com a mimetizada cena.
No fundo, sob o manto de falsas bênçãos, está a curiosidade pela morte alheia, pela doença que devassa o corpo de outrem, pelo dinheiro que surge do chão sempre que aquele cadáver andante esterta vida.
Abutres que vivem da desgraça alheia, como os homens e mulheres de bem que controlam o vai-e-vem da rua (sempre pobre, sem asfalto e cheia de lixo), estavam todos lá fotografando, afagando com micróbios, afogando em palavras alguém cuja vida é um peso para si e um meio de vida para tantos outros.
A manhã, fria, tornou-se patética e cadavérica a pleno sol de agosto.
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