As trevas de hoje, a boemia de ontem



A boemia, antes exercício natural de muitos daqueles que hoje temos como ícones literários e musicais, tornou-se um argumento desfavorável à confortável vida tranquila e produtiva do nosso cotidiano. E talvez seja isso o que torna as produções artísticas medíocres, acarretando em um insignificante diferencial no mercado de trabalho.  
É durante a noite que as ideias podem fluir mais calmamente, ou não, e abundantemente. Que se pode reinventar métodos. Resolver conflitos e definir novos métodos produtivos. Nessa ausência efetiva do sol  a qual chamamos de noite, é que se pode, com a clareza de quem conhece a si e seus problemas, provocar as revoluções na música e na escrita, que sempre influenciam gerações.
Mas a boemia quase acabou. Nos bares, quem sobreviveu à onda das redes sociais, não mais inova, apenas  trata de não esquecer o que viveu - enquanto o álcool permite. Nos passeios, a violência  - que dizem ser maior hoje que ontem - espantou os casais públicos. Ninguém mais tem tempo de ir à praia à noite. Deixaram que as traças corroessem a alegria da noite em detrimento de uma programação de televisão ou pelo apelo da virtualidade das amizades de rede social.
E agora, sem misticismo, sem lendas urbanas, sem a alegria de uma boa noite boêmia, chegou o período de trevas e ranger de dentes da vida bem vivida. Se o "mal do século" matou prematuramente grandes mentes, também produziu grandes obras e, certamente, deu vida a quem procura. Nessas trevas, com o valor do capital mensurando poesias e prosas, músicas e liberdade de expressão, estamos esperando a morte, lenta e demorada, em frente à uma tela sem vida.

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