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Mostrando postagens com o rótulo Tristeza

O que vejo na rua

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Arte: Cleopatra and the Peasant. Eugène Delacroix. MET. Às vezes, quando vou sair ou quando estou em minha mesa, paro por alguns instantes e olho a rua e os transeuntes. Vejo a mulher que empurra um carrinho de mão cheio de material reciclável com o rosto pingando de suor ao sol da tarde; vejo o drogado do fim da rua que busca uma porta esquecida entreaberta; vejo o morador da casa em frente que sai à rua com sua cadeira branca, sempre no mesmo horário; vejo os carroceiros esperando um serviço fortuito; vejo crianças brincando nas calçadas; vejo os fiéis indo aos seus templos cumprir com suas obrigações espirituais e seculares; vejo a mercearia da esquina que nunca tem gente. Parado, observando, vejo todas essas pessoas que dão vida a uma rua, a um bairro, sempre buscando, para lá e para cá, um sentido para as suas vidas e o dinheiro necessário para suprir as suas necessidades. Vejo em alguns uma tristeza transbordante que queima a pele e endurece o rosto. Vejo em outros um...

Vida imposta

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Obra: Convalescent, Mme Lepère. Auguste-Louis Lepère. Met. Sob este mesmo céu ainda ouço o estalar do chicote e o sangue que de mim escorre Sob esta mesma pele sinto a vida e a tristeza que de mim se desprende em ondas em dores em saudades Sob esta vida que me impôs sob este céu que me obriga a viver sinto as feridas que faz mim uma triste e feliz existência

A queda para a alegria do homem

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Adão caiu para que os homens existissem; e os homens existem para que tenham alegria. 2 Néfi 2:25 Adão, de Tullio Lombardo. Quando você sai à rua e vê os pregadores destilando tristezas a cada leitura de versículos bíblicos, as mulheres lamentando a falta de sorte em “ter um homem que valoriza” o trabalho delas, os cobradores xingando cada partícula de poeira que cai em sua caixa registradora e alguns estudante em completado estado de drama e melancolia é possível perceber que a queda de Adão parece ter sido desnecessária e inútil. No segundo livro de Néfi todos podem tomar conhecimento de uma verdade que transcende qualquer conhecimento apóstata que tenha sobrevivido – o homem existe para buscar a felicidade e serem alegres. Mas alegria de verdade, não somente aquela encontrada em estados efêmeros. E como Leí mesmo disse, ainda no segundo livro de Néfi, o arbítrio está aí, com todos e qualquer um e com ele pode-se escolher de qual lado você deseja ficar – ...

O amor na madrugada

Todas as noites são existências de um sofrimento inominável que sai de você para mim sempre que seu sorriso quebra a geleira da minha alma. Assim como o calor derrete o gelo da garrafa ao lado do nosso sofá, displicentemente esquecido no começo de nossos devaneios de uma noite quente, o seu sofrimento de uma entrega intensa, duvidosa, é a prova de um grande amor conservado a temperaturas oscilantemente trabalhadas em nossos corpos. Meu grande amor cabe em uma minúscula artéria que imiscui-se a tecidos e vasos e quase se rompe sempre que o seu cheiro faz-se presente ao meu alcance limitado. Meu grande amor pode ser visto em poesias mal feitas escritas em guardanapos roubados das mesas vizinhas, em bares, restaurantes, lanchonetes, lugares comuns. Meu grande amor é triste pelo fim que imagina para si, entre soluços e lágrimas que não se contém no sofrimento mudo de palavras não ditas. É triste pela vida que acontece e que pode, repentinamente, acabar com uma pequena palavra dita. D...

Fotografia, um poder imenso

Quem não tem fotografias guardadas? Retratos que registraram tantos momentos implícitos, tantas formas ímpares de dizer palavras sem ao menos abrir a boca, ou sorrir sem desgrudar os lábios. Nas imagens que estão guardadas, onde está aquele desejo de imensidão que tomava conta das ruas e diminuía o esforço de viver na corda bamba das decisões difíceis? Talvez não sejam milhares de fotos, nem tenham pessoas bem vestidas em poses poderosas. Talvez os papéis coloridos recortem sua alegria silenciosa em um dia à beira-mar, em que a saudade aflorou a paixão e todas as palavras do mundo poderiam ser ditas em um único gesto, quem sabe um grito? O poder do registro é imenso. O da fotografia extrapola esse poder e estabelece fundamentos únicos que são seguidos à revelia dos indivíduos, pois ela guarda histórias inteiras, breves lapsos de vida, uma gigantesca expressão intraduzível. Lá, entre folhas rabiscadas, livros lidos, planos, pessoas, passado, poeira, está o que realmente impo...

Ida da Tristeza #05

Vai tristeza minha leva a melancolia que tenta nos enfrentar traz de volta: A nossa pornografia tão querida                       A nossa cumplicidade tão amada                       A nossa dúvida tão repudiada                       O nosso "duplo sentido" tão utilizado                       A nossa vergonhosa nudez Quando chegar lá: pede para voltar nossas lágrimas                                       ...