Pernas dirigíveis

Foto: Rua ao lado do mercado público. Palmeira dos Índios - AL.
Mar/2017. Rafael Rodrigo Marajá.

Ela ama cada um e todos, pagantes ou não por seu amor. E mesmo que não faça muitos esforços, todos  a querem, mesmo algumas mulheres que também gostam do delineado corpo feminino. Quando levantou a cortina e entrou no banheiro para mais um banho preparativo, o celular tocou. O número, conhecido, chamou por um tempo até desistir. No cubículo ela ensaboava o corpo moreno que tantos provaram e que a muitos outros enlouqueciam. Deslizava a esponja pelos braços, pernas e bunda lembrando-se dos elogios da noite passada - Já haviam sido tantos e tão iguais que a monotonia começava-lhe a causar tédio. Ela queria o novo e o ousado; a emoção que faz faltar o ar e que não é conspurcada pelo drama daquilo que chamam amor. Ela queria alguém que arrancasse sua pele com a fome de um macho por uma fêmea, sem cobrar-lhe fidelidade ou amor, mas que, mesmo assim, cuidasse dela com o cuidado que só uma orquídea merece. Era o que todas queriam – cada meretriz, cada vendedora de churrasquinho, cada mulher de respeito.
Enrolada com uma toalha rasgada e desbotada pensava em quem encontraria e no que faria. Nem sempre sexo, nem sempre conversa, ela acabava sendo, de um jeito ou de outro, a mulher perfeita para homens frágeis que aprendiam o sexo vendo filmes pornôs ou em conversas toscas com os amigos. A gozada na cara humilhava-os e os falsos gemidos nunca foi o suficiente para ela, nem mesmo em fetiche porque ou não saia igual aos filmes ou porque seus gemidos adiantam os já tão precoces clímax desses homens ingênuos demais para pensarem com a cabeça de cima.
Vestiu-se e sentou-se à porta do bar, olhando os que passavam apressados, os musculosos que voltavam da academia e os que não tinham coragem de olhá-la nos olhos, mesmo quando estavam sobre ela, ofegando. A rua, suja e com carros antigos, poderia ser de qualquer cidadela da América Latina e do Caribe, com carros antigos, esgoto exposto, moscas, mau cheiro, bêbados e vadios. Sentada, apoiada na parede ensebada, a vida passava-lhe dando sinais de deboche. 

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