23:00 - Filhos do Diabo*

Quadro: Max Ernst. 1924.

Envelhecendo na mesma proporção em que a juventude faz seu melhor retrato na praia poluída de gritos não dados em respeito à boa educação, reprimidos pelo ego alheio, fazem de si a caverna de estratagemas promíscuos que levarão ao fim seus anseios mais baixos. Tornando-se velhos em plena flor etária estão nossos rostos sem bênçãos necessárias. Aparências sem alegrias na chuva ácida do asfalto que buscam em falsas jóias seus problemas resolver sem a palha levantar.
E consome-se toda a vida em tragadas fumacentas de drogas inaladas na ilusão de corações quebrados na rebentação de rebolos em motéis de quinta esquina do baixo prostíbulo do qual entrada não é preciso para morrer.
Morreram, então, e no abrir dos olhos no paraíso não estavam nem anjos, ou demônios lhes abraçavam, mas o movimento vivificador mostrava-lhes as fases da evolução em arrependimentos, blocos de realidade que fizeram até o mais sacro presente glorificar a verdade de lençóis sujos e rostos esquecidos de caminhar em rotinas ditas saudáveis, de levar encoleirado seu bom humor no passeio à padaria e, na fotografia sem sorrisos, podem voltar e abrir ao mundo as boas novas que na cadeia aprenderam.
Foram envelhecidos nos amores encarcerados das celas, forçados ao nojo do submundo aprenderem as trapaças e descometerem sua índole ao que acreditavam ser de bom grado à revolta juvenil que tanto adoravam. Foram do fim ao começo em uma noite vergonhosa e do caminho fizeram as sobras que do cotidiano fazem seu alicerce. A proporção foi perdida na dureza do mundo parido por homens sem lei, caindo no que sem nome chamam e para o sempre estarão marcados com as faltas um dia realizadas.
Envelheceram com as memórias e de uma coisa não podem queixar-se: passaram pelo mudo arruaçando os dogmas de falsos profetas com a força de um elefante em livre correria pelo mundo corrupto de dinheiro e drogas. Não precisaram de choros e velas em seus velórios, e de tapetes a dispensa será dada. São da escória a elite e do mal o bem, merecido por todos e por ninguém esperado na hora do almoço dificilmente preparado. Ou no sono sem precedentes preguiçosos planejados.
De tudo fazem parte e de cada aparte são um adendo para nobres políticos e pederastas pobres que filhos transformam em marginais da lei do cão. Fazem de nós o retrato não tirado na praia não visitada. São do diabo os filhos deserdados e dos homens os herdeiros do reino incerto do amanhecer demorado no horizonte febrento da esquina da vida.



*Do livro Pavilhão do Vizir, Rafael Rodrigo Marajá

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