Cagar no mato
Os hábitos são estranhos. É o que há de mais estranho e doentio que pode ser desenvolvido por uma pessoa. E cheguei a essa conclusão observando o meu vizinho de frente.
Certo dia estava eu olhando para o nada, naquele ponto no infinito que nos faz parar com os olhos vidrados, quando ele sai de casa, muito desconfiado, e vai para um matagal no fim da rua (uma rua originalmente sem saída mas que possuía um mato fechado no fim).
Tudo bem, pensei, quantas pessoas não gostam de ficar sozinhas nos matos da vida?
No dia seguinte, praticamente no mesmo horário, lá ia ele de novo. E nada seria estranho uma vez que por essas bandas alagoanas os velhos e velhas fofoqueiros, sem mais nada para fazer, sempre saem regularmente para avaliar a vida alheia. Sim, mesmo escondidos no mato.
A rotina do meu vizinho era constante. Até que um dia a mulher dele revelou a bomba!
Ele saia duas vezes ao dia para o mato para cagar! Deixava o conforto e a limpeza do banheiro em casa para a emoção de espalhar bosta pelo chão, sentido o cheiro do mato e a iminente chegada de alguém. Talvez ele queria que a visão dele cagando fosse vista e comentada ou que poderia economizar água e dinheiro nessa prática. Seja qual fosse o motivo, um dia ele perdeu o banheiro.
E só perdeu por que o mato foi desvirginado por máquinas pesadas da construção civil, que em seu furor pelo desenvolvimento tirou a privacidade do cagão.
Ruas foram abertas e lotes delimitados. E com muita sorte o lugar com a pesada camada de bosta, de anos de caganeira, foi estuprado, exposto, mas intocado em seu espírito de bosta.
Sob a mangueira, onde ele se aliviava hoje tem uma sala de estar, montada por ele, onde ainda vai para passar o tempo. E embora não possa mais baixar as calças e deixar os restos do almoço e do jantar, ele sempre está lá - hora instante de levar uma mangada na cabeça.
A raiva, por gastar tanto com material de limpeza e água, subiu-lhe à cabeça e agora ele vai cagar em Palmeira de Fora, uns dois quilômetros de casa e do mato preferido. Tudo pelo bem do próprio bolso e pela emoção. Só imagino o que fará se um dia lhe der uma dor de barriga pesada no caminho.
Mas hábito é hábito. E dentro destes sempre há loucura. Está aí meu vizinho que não me deixa mentir.
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Foto: A sala de estar, antigo banheiro do cagão. |
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