A moeda e a flor

Quadro: The Steeplechase, Coney Islan. Milton Avery. 1929. Metmuseum.

Se não for o dinheiro, é o amor que nos move todos os dias para um trabalho - às vezes medíocre - todas as manhãs. Quando não é o dinheiro, é esse tal de amor - que até hoje ainda não encontrei e creio que muitos milhares também não - que nos oprime e faz com que a indústria da beleza seja uma das mais estáveis. Essa dobradinha entre o amor e o  dinheiro é interessante sobretudo porque, excetuando-os, quase nada resta para nos motivar.

Trabalhamos para comprar casa, carro, comida, roupa, ostentar cartões de crédito e débito. Trabalhamos para, na conquista moderna da fêmea, ter um diferencial em relação a outros machos - se você for gordinho ou simplesmente fora dos padrões fitness  pode investir no trabalho de boa remuneração; nada é tão excitante quanto um poder de compra alto. Trabalhamos  para não ficar para trás quando o assunto é sexo. 

O outro lado da moeda, esse tal amor, é muito funcional para justificar o feio com a beleza e as escolhas - duvidosas - que vemos por aí. Ele é cor de rosa depois de anos em solene matrimônio ou de efêmera relação "indecente". O amor, assim como o dinheiro, é uma delícia que completa a luxúria, a depravação, a calma e as horas de desassossego noturno.

O amor, símbolo e sinônimo sexual, é a maior falácia não-vivida do Ocidente.

O anjo pornográfico, Nelson Rodrigues, estava mais do que certo ao afirmar que o dinheiro compra até amor verdadeiro. Outro dia, caminhando no shopping, vi o amor na vitrine de quase todas as lojas. Em algumas ele estava em um manequim e em outras era o próprio desejo saltando aos olhos. E com preços diversos, o amor tinha intensidades das mais diferentes. Quase todos deixavam o shopping com o amor em sacolas - uma delícia de se ver.

Nesses tempos conturbados onde tanta gente procura a depressão e a síndrome do pânico para justificar suas vicissitudes - porque quem realmente sofre desses males não dramatiza como em uma novela mexicana - absurdamente infantis, ter dinheiro significa mudar de roupa, de amores e de paciência.

Se não o amor, que pelo menos o dinheiro nos salve de nós mesmos.